terça-feira, 19 de junho de 2012
05:46
Eu gostaria que meu pensamento fosse um pombo, e minha imaginação, toda linguagem do mundo. Um beijo é tão conceitual quanto uma pedra. Um sorriso, anotomicamente falando, é o espreguiçar da boca triste. O suor é tanto um pedido de licença do salgado em nós como um convite para namorar comigo. Um cheiro é uma verdade que fugiu para o nariz de quem nunca esquece. O teu gosto é cápitulo inteiro, salpicado de versículos arranhados e mordidas no cangote.
E foi atrás desse conceito, de sua anatomia, do que salga os corpos; que fui me encontrar naquela noite. Nos avistamos quase imperceptivelmente que um aperto de mão ou um abraço amigo não se fez necessário. Nos ritmamos e entramos na primeira ruela. Acendi um cigarro para iluminar o caminho. Você ri baixinho, disse que gosta quando eu acendo um cigarro sem motivo. Sem merecimento, lembro você dizendo uma vez, como se houvesse uma necessidade de se merecer uma recompensa. Mas eu mereço, pensei alto. Minha recompensa é esta. Você ri baixinho.
Começamos a nos entornar pelas ruas, cada vez mais latitudinais, e os poucos moradores que nos miravam como morcegos recém despertos não se incomodavam com a passagem. Ao fazer o retorno, sinto algo me puxar. Você me chama e aponta para o fim da vida. Um cidadão de meia-boca nos indaga sobre aquela peregrinação desorientada. Olhares trêmulos na boca. Ele repete, pergunta se estamos perdidos. Você diz que ainda não e eu não consigo prender o riso. Você remedia dizendo logo em seguida que viemos comprar um "dog" e ele vai nos seguindo de longe, enquanto damos meia-volta. Olho sua cara de redenção e vou até o sujeito. Volto a você e tiro do seu bolso duas moedas. Após o escambo, te puxo pra fora do asfalto. Uma árvore se ramifica no tornozelo. Você diz que é loucura demais. Digo que não importa, que vamos andando, deixa pra trás. Nada disso importa. De resto, no cume, ficam os morros.
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