Vivemos uma época rica demais, uma vida delirante, sem parar, dia e noite, que nos arma a cilada das suas tentações monstruosas.
Uma velocidade louca arrasta o mundo e pega-o num turbilhão em que milhares de “indivíduos-borboleta” serão afogados sem esperança.
Vida perigosa e magnífica para os que saberão nadar nesse caos belo como o mar - “não se deixar tragar”.
Um mundo de homens, sombras de homens, formiga à nossa volta. Quebrados, rejeitados, não puderam resistir Às forças negativas e destruidoras que toda sociedade traz em si.
Quero prestar minha homenagem a todos esses infelizes - esses libertados, esses abandonados -, a todos aqueles que quiseram viver livres, que quiseram gritar a verdade tão perigosa de ser dita - os que não quiseram ficar na calçada e foram vítimas disso. Quiseram chocar-se frontalmente contra as hipocrisias e as mentiras sobre as quais se edificam as sociedades. Nas prisões, nos asilos, debaixo das pontes, se encontram, tenho certeza, espécimes de humanidade admiráveis e decaídos, que não tiveram a força de atravessar essa linha média, razoável, sufocante, que a ordem burguesa estende pela vida para impedi-los de passar. Alguns conseguiram vencer essa barreira - são os criadores e os realizadores de hoje. À força de energia e de talento, eles se impuseram. Mas lembrem-se de que estes homens são da mesma família daqueles outros que acabo de citar...
(LÉGER, 1989, p. 105).
LÉGER, Fernand, Funções da pintura. São Paulo: Nobel, 1989
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